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sexta-feira, 4 de abril de 2014

sobre a H, para a Vera


viveste aqueles nove meses a agradecer a vida que aí vinha. reconhecias a maravilha do dom que lhe era dado. reconhecias a maravilha de vir mais um, são sempre tantos e tão poucos. a família, dizias, quer-se grande, quer-se gigante. querem-se casas de confusão, querem-se tapetes gastos, querem-se paredes riscadas e quer-se divisão de roupas até à exaustão. e com ela, sempre tinha sido assim. com ela tinhas vivido os primeiros nove meses, com conversas que não acabavam. e não acabaram cá fora, nunca. a ponto de tantos se perguntarem o que é que aquelas duas, que vivem debaixo do mesmo teto, ainda têm para falar? mais tarde, com a chegada da idade do armário, passou a ser a pessoa que querias mais longe, à distância do sol sff. e quando reconheceste que os nove meses valiam mais do que qualquer coisa e te reaproximaste, descobriste que ninguém te conhecia melhor, ninguém te percebia melhor debaixo de água, ninguém era tão parecido contigo como ela. e ninguém era mais diferente de ti, também. e passaram a ir sair juntas à noite, dançar até de manhã e voltar para casa de vespa, sem carta mas radiantes com mais uma noite passada a duas. as amigas começaram a ficar irritadas com tudo aquilo, agora bastavam-se uma à outra! descobriste o que te ficava melhor e pior ao ver nela o reflexo do que eras, foste cobaia de cortes de cabelo, fizeram viagens juntas, leram livros a meias e planearam viver no mesmo prédio apenas separadas por uma porta - sem chave.

a vida avançou e com ela a realidade. continuaram próximas-que-enjoa mas agora cada uma no seu caminho. e foi há seis meses que te contou que daí a seis meses nascia mais um bébe na família. acompanhaste aqueles nove meses com um amor diferente, esse bébe estava na barriga de uma pessoa com quem já tinhas estado dentro de uma outra barriga. raciocínio complexo. ele dizia que andavas nostálgica como se a criança fosse um bocadinho tua - e era. e é.

passaram-se os tais seis meses. estava a sair da V a caminho do metro. o dia parecia-me diferente e quis esperar pelas 21h para pôr o pé no elevador, afinal de contas o hospital seria sempre ali ao lado, caso ela já lá estivesse. passava por Chelas e ia a ler o livro que ele me tinha dado, quando recebi a mensagem do L: "a vossa irmã vai ter o filho agora!". fora de pieguices, o senhor que estava sentado à minha frente deve ter lamentado os sete quilos de cebolas que eu tinha estado provavelmente a descascar. coração pára, sete segundos. do L, outra vez, recebo um "agr! é uma miúda!". mais setenta cebolas para a mesa sete e o coração re-arranca. metro chega a São Sebastião, corro na fuga das galinhas para a linha azul, três minutos que parecem trezentos e chego finalmente ao carro. apanho os pais e corremos para a maternidade. chegamos ao quarto e dizem-nos que a Teresa ainda está no recobro. tudo fica descansado e à conversa. e é aí que eu decido que preciso de a ver.

começo a andar pelos corredores, trás-frente-trás. não diz recobro em lado nenhum, será que é para despistar pessoas como eu?, continuo a andar com ar bonzinho e 100% suspeito. decido perguntar, como quem não quer a coisa, é no piso de baixo menina diz a enfermeira desconfiada. sorrisinho e finjo ser apenas curiosidade. mal ela vira costas, atravesso o corredor em passo rápido, ele vê-me e acena que não com a cabeça a saber perfeitamente para onde me dirigia, carrego no botão do elevador e chego à porta do recobro. esperei e esperei que aparecesse alguém. preparei um discurso sério e irrecusável e finalmente apareceu a vítima: a enfermeira do recobro. olhe eu sou gémea da Teresa que teve agora um bébe e gostava mesmo de a ver. acho que reforcei o gémea com dois tons acima do normal e três tempos de pausa entre sílabas, sabia ser esse o meu principal argumento. e foi aí que entrei e as vi pela primeira vez, mãe e filha. conversámos, agradecemos, rimos e ficámos em silêncio. reconheci a alegria no sofrimento - diferente de tudo aquilo que alguma vez tinha presenciado.

durante essa semana, não consegui trabalhar. a minha cabeça estava lá, a ponto do L dizer que devia existir uma licença para tias! continuo assim e qualquer desculpa é boa para passar lá em casa a dizer olá, desculpem tinha mesmo que trazer estas faturas à Teresa..

a minha Teresa tem uma minha-Helena. e aquele bocadinho dela que eu quero que seja meu, passa amanhã a ser: batiza-se às 18h30 e vou ser a madrinha daquela miúda querida, que já adorava antes sequer de saber que vinha a caminho :)

7 comentários:

Lopo disse...

OBRIGADA!!!

AMG disse...

Quem é a Vera??

Vera disse...

Sou eu :)
Obrigada Ana querida. Um dia a Helena vai adorar ler isto!!

Anónimo disse...

Muitos Parabéns. Que grande bênção de Deus!!
Muitas felicidades para toda a família.
desculpe lá a pergunta mas a sua irmã é Vera ou Teresa?
Um bj

Ana disse...

Olá! A Vera é a minha querida prima, e a Teresa é a minha irmã. Dediquei o post à VEra porque foi ela a sugerir-me escrever sobre a Helena :) Um bj!

Unknown disse...

Acabei de reler este post! Que emoção relembrar tudo isto Nana :')

Ana disse...

podji crer! im next uhuhh